sábado, outubro 28, 2017

Cientistas brasileiros debatem o formato da Terra



O professor de Física da UFRGS, Fernando Lang, promove uma palestra intitulada “Sobre a forma da Terra”, que está sendo apresentada em diversos eventos científicos pelo Brasil. Só em outubro, a palestra foi apresentada em Porto Porto Alegre (19/10), Brasília (23/10) e Natal (25/10). Dedicada ao público acadêmico, as palestras são motivadas por um debate inusitado que tomou conta das mídias sociais a respeito do formato do planeta: a Terra seria uma esfera ou um mundo plano?

No site do Facebook, a página americana da Sociedade da Terra Plana (The Flat Earth Society) possui mais de 100 mil seguidores do mundo inteiro. Aqui no Brasil, a página “A Terra é plana” já possui 79 mil seguidores.

Disposto a combater as crescentes alegações de que a Terra seria plana, o professor é ativo em discussões na internet. Para Lang, o modelo de uma Terra plana é anacrônico e esdrúxulo, uma concepção que têm origem em interpretações literais de passagens bíblicas. “Atualmente, a internet, conforme notou Humberto Eco, deu voz aos idiotas da aldeia. Teorias negacionistas e conspiracionistas proliferam nas redes sociais. Terra Plana é apenas uma das tantas imbecilidades.”, destacou.

Num artigo intitulado “Sobre a forma da Terra”, Lang descreve algumas peculiaridades do pensamento terra-planista (termo que designa os adeptos da Terra plana): a Lua possuiria iluminação própria, o Sol estaria há poucos milhares de quilômetros da superfície terrestre, as viagens espaciais seriam impossíveis, o homem não foi à Lua; e até mesmo a existência dos satélites de comunicações é negada. Segundo Lang, o responsável pelo retorno dessa concepção foi o inventor britânico Samuel Rowbotham (1816-1884), que escreveu uma obra intitulada “Astronomia Zetética: a Terra não é um globo”. Muitas das ideias desse autor são adotados hoje pelos terra-planistas.

O OUTRO LADO
“A Terra possui todas as evidências de que é plana”, afirmou o doutor em geofísica e ex-professor da Universidade de São Paulo, Afonso de Vasconcelos Lopes. Num vídeo publicado na internet, ele reconhece ser o primeiro geofísico a admitir essa visão do mundo, embora ele ainda esteja estudando a “nova” concepção.

Para ele, a hegemonia da crença no modelo da Terra esférica ocorreu devido à propagação de um erro sobre a natureza de nosso mundo. Um engano inicial teria desencadeado outros erros; e o consenso entre cientistas e a grande mídia propagou-os até os dias de hoje. Portanto, segundo Afonso, não seria necessária uma “super conspiração” internacional para enganar o mundo inteiro, como acredita uma boa parcela dos terra-planistas.

Ele também destaca a falta de liberdade dentro do mundo acadêmico em questionar as teorias científicas mais aceitas. De fato, quando anunciou suas ideias na internet, o geofísico foi “bombardeado” por críticas e xingamentos. “Isso não é uma discussão de criancinhas”, enfatizou, revelando que também demorou a questionar o modelo vigente. “Eu também fiquei muito nervoso quando um amigo contou-me sobre o modelo da Terra plana, pois eu tinha como certa a ideia da Terra como um globo”, disse ele.

O geofísico mantém um canal no YouTube onde também questiona outras teorias amplamente aceitas dentro da comunidade científica, como a teoria da relatividade e o darwinismo.

O MODELO DA TERRA PLANA



Para os terra-planistas, a Terra seria estacionária, ou seja, ela não giraria em torno de si, nem em torno do Sol. Os adeptos dessa crença apontam para a estranheza no fato de a humanidade observar as mesmas estrelas no céu há milhares de anos, apesar de nosso planeta estar teoricamente vagando pelo universo a uma velocidade de mais de 870.000 km/h.

Se a Terra não é um globo, ela não teria polos. Ou seja, o que conhecemos como sendo o Polo Norte seria a região central do mundo; e a Antártida não é um continente no Polo Sul, mas sim a região gelada que cerca todo o mundo conhecido. Os terra-planistas alegam que uma das evidências disso seria a inexistência de vôos comerciais que sobrevoam o “suposto continente antártico” no sentido Norte-Sul. Para eles, o Tratado da Antártida (1959) impede que pessoas não autorizadas explorem a região e descubram que não vivemos num globo.

O Sol seria um pequeno luminar que circula sobre a superfície da Terra há apenas alguns milhares de quilômetros. Quando ele se distancia de uma região, ele ficaria tão longe que anoiteceria. Dessa forma, não existiria pôr do sol atrás da curvatura do planeta, como costuma-se pensar.

Os críticos desse modelo afirmam que ele é impossível, pois, se vivêssemos num mundo plano, o Sol e a Lua sempre poderiam ser vistos de qualquer lugar do mundo e em qualquer hora; mas não é só isso. Eles já apresentaram diversas contestações desde que essa teoria ressurgiu com mais força na internet, por volta de 2015. O prof. Fernando Lang, por exemplo, mantém um site na página virtual do Instituto de Física da UFRGS, com vários textos que objetivam refutar o modelo da Terra Plana.

TEORIAS DA CONSPIRAÇÃO
Uma foto da Terra tirada do espaço seria uma prova cabal do verdadeiro formato do planeta, mas — para muitos terra-planistas — a Nasa e as demais agências espaciais estão fora da lista de fontes confiáveis, pois demonstram inconsistências em suas informações, além de estarem comprometidas em enganar a população. Um dos fatos mais suspeitos seria que a Nasa afirma não mais possuir a tecnologia usada para ir à Lua entre 1969 e 1972.

Durante uma entrevista, o astronauta Donald Pettit afirmou que a Nasa destruiu essa tecnologia, de modo que hoje eles não conseguiriam repetir a viagem até a Lua. Além disso, em 2006, a Nasa informou ter perdido as 700 caixas da gravação original feita pelos astronautas da missão Apolo 11, da chegada à Lua. Os céticos afirmam que somente com a gravação original seria possível analisar as imagens em alta resolução e constatar a veracidade da viagem.

Essas suspeitas alimentam teorias da conspiração, nas quais os governos, juntamente com as agências espaciais, estariam enganando a população para ocultar a realidade a respeito da verdadeira natureza do mundo.

GLOBALISTAS VERSUS TERRA-PLANISTAS
Existem várias comunidades virtuais dedicadas ao tema. Enquanto algumas defendem que a Terra é plana, outras reagem, defendendo que ela é um globo (estes são chamados de globalistas). Por exemplo, no Youtube, destacamos dois canais que reúnem milhares de seguidores: o canal Sem Hipocrisia e o canal Sistemático. O primeiro é terra-planista e, em alguns de seus vídeos, apresenta experimentos tentando verificar se é possível detectar a curvatura da Terra, já que ela seria esférica. O segundo dedica-se a refutar os argumentos levantados pelo canal terra-planista, alimentando a polêmica e atraindo cada vez mais curiosos. Ambos os lados alegam adotar o método científico.

Tanto no Brasil quanto no exterior, os experimentos realizados pelos terra-planistas geralmente são feitos no mar, nos quais os responsáveis demonstram poder avistar formações geográficas e cidades que, segundo eles, não deveriam ser vistas caso a Terra fosse esférica, devido à grande distância entre esses locais e o observador. Enquanto os terra-planistas afirmam que seus experimentos não encontraram a suposta curvatura, os globalistas reavaliam os resultados, afirmando que a curvatura foi encontrada. Entre acusações de desonestidade intelectual e fanatismo religioso, a discussão entre os dois grupos segue acirrada.

CAINDO NO ABISMO
“Se a Terra é plana, por que você não vai até a suposta borda terrestre e se joga no abismo?”. Essa é uma das principais provocações feitas contra os terra-planistas nos debates pela internet. Porém, para os crentes no mundo plano, essa missão suicida seria impossível. Segundo eles, quando navega-se no sentido Leste-Oeste, o viajante está apenas circulando o centro da Terra, visto que o Norte magnético é o centro do mundo.

Um explorador que viajasse no sentido Norte-Sul depararia-se com a Antártida. Indo além dessa região, alguns terra-planistas acreditam que existiriam novas terras inexploradas. Outros acreditam que o explorador seria impedido de ir adiante por uma barreira de vidro fundido, o domo que envolve a Terra. Em outras palavras, não haveria um abismo de onde alguém poderia despencar.

A crença num domo gigantesco que envolve o mundo vem do conceito bíblico de “firmamento”, que seria uma estrutura rígida e intransponível que separa a atmosfera terrestre das águas que estariam acima, conforme descrito em Gênesis. Desse modo, o espaço sideral seria, na verdade, composto por água e não pelo vazio. O firmamento seria a estrutura protetora que impede que essas águas inundem a Terra.

No “Manual politicamente incorreto da ciência”, o ensaísta americano Tom Bethell denuncia o mito segundo o qual, durante a Idade Média, a maioria dos cristãos acreditava que a Terra era plana. Ele atribui essa crença a pensadores americanos do século XIX, como John William Draper e Andrew Dickson White. Segundo Bethell, foi deles a ideia de que a Igreja Católica seria inimiga do conhecimento e difundia a crença na qual navegadores que se afastassem demais da Europa cairiam nos abismos da borda da Terra. Bethel demonstra que, embora a viagem de Cristóvão Colombo tivesse sofrido algumas objeções, nenhuma delas foi relacionada à esfericidade da Terra.

Na obra, Bethell aponta vários mitos amplamente aceitos dentro e fora do mundo científico. Como exemplos, têmos a questão do aquecimento global como causa da ação humana; o darwinismo como uma verdade plena; a esperança nas energias ecológicas (solar e eólica); e a crença na epidemia alarmante da Aids no continente africano. Segundo o autor, muitos desses mitos são mantidos essencialmente devido a interesses financeiros de grande parte da comunidade científica. “Esse objetivo financeiro se traduz em obter mais verba para suas pesquisas, que se materializa em bolsas de pesquisas para eles e seus acólitos, e rios de dinheiro para seus equipamentos e edifícios”, escreveu ele.

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