segunda-feira, janeiro 23, 2012

Caráter, impunidade e a corrupção no jeitinho brasileiro

Já há um bom tempo venho percebendo nuances comportamentais que me levaram a diferenciar as pessoas que moram na capital daquelas que moram nas cidades do interior. Os indícios são fortes, ainda que não consiga prová-los por enquanto. Mas as pessoas que vêm do interior são, em sua maioria, mais bem educadas, cordiais e seguras do que as que vivem aqui em Natal, que carecem de valores exemplares. Seria a competitividade? Seria a corrupção da alma pelo poder? Seria a cultura do egoísmo? É o capitalismo? É o Brasil? Sou ingênuo demais?

Não sei, mas o que eu percebo é uma perda de valores independente de sexo, classe social e idade. Certamente tal dúvida fará parte de minhas pesquisas futuras. Pierre Bourdieu será um bom começo na pesquisa, mas também deve ter alguma explicação na psicologia evolutiva para isso.

Voltando, é triste; mas é comum ver aqui pessoas desesperadas que trocam amizades por empregos; jogam fora a confiança por motivos banais; destroem relacionamentos sem qualquer motivo; desrespeitam os outros gratuitamente e coisas do tipo. Eu mesmo diria que esses sintomas ocorrem por que as pessoas são humanas. Desrespeito, traição e desconfiança são coisas comuns de nossa espécie. Mas o que diferencia as pessoas? Por que algumas, apesar de serem humanas, mantém valores superiores como a cordialidade, a honestidade e o respeito; enquanto outras não fazem qualquer questão disso?

Por exemplo, hoje vi um senhor de idade entrando em desespero depois de se envolver num pequeno incidente de trânsito. Não houve nenhum dano material relevante. Por impaciência e falta de destreza ele acabou arranhando o carro de outra pessoa, mas, na falta de segurança e controle psicológico - talvez devido à idade, ele se defendeu da culpa de forma ilógica, por meio de xingamentos, descontrole e recorrendo a um eventual poder superior que possuiria, o qual lhe garantiria a impunidade por tal ato. No fim das contas, o idoso tentou colocar a culpa no outro e o ameaçou com uma suposta autoridade. Não sei até que ponto esse comportamento é comum numa escala mundial, mas acredito que pelo menos aqui no Brasil esse comportamento e o recurso a ameaças que o envolvem ("você sabe com quem está falando?") não são punidos. No Brasil, qualquer um pode se utilizar disso, como foi o caso do "promotor de justiça" idoso do caso; e ainda ter algum tipo de crédito.

Não é a primeira vez que vejo crimes contra os valores ocorrer de perto. Há tempos, testemunhei algo do tipo, quando uma pessoa, percebendo que ninguém faria nada a respeito, tentou punir um ato de furto feito por um amigo seu. Na verdade, quem foi punido foi quem tentou tentou punir. Todos ficaram contra quem queria fazer o certo. Ou seja, é a valorização da cultura da malandragem? Parece que, no Brasil, é errado ser correto. Ou seja, não é coisa que só encontramos no meio político, como eu mesmo já relatei nos idos de 2005, num artigo para a imprensa intitulado "Eleitores que corrompem".

http://nestorburlamaqui.blogspot.com/2006/08/eleitores-que-corrompem.html

Diferente do que prega o senso comum, não há uma barreira definida entre políticos e povo. É óbvio, mas às vezes é bom ressaltar o óbvio. Ou seja, o que chamamos de corrupção estaria intrincado em todas as instituições de nossa sociedade. Acredito que o que pensamos ser corrupção na verdade é mais uma consequência de falta de valores em todas as relações sociais do que necessariamente uma falha num sistema legal de punições contra corruptos. Em suma, é algo que vem de casa mesmo. Alguns pais, logo cedo, ensinam os filhos as vantagens do jeitinho brasileiro.

Analisando os dois exemplos, perceba que o primeiro demonstra bem o recurso à impunidade para se dar bem; enquanto o segundo caso é a reprodução dessa mesma impunidade , feito por pessoas comuns.

No fim das contas, num nível científico, vale a pena registrar essas desconfianças que formulo por aqui. Mas uma coisa é levantar essas observações. Outra coisa é explicar se isso se relaciona com aquela distinção inicial que fiz entre pessoas do interior / pessoas da capital. Talvez não tenha nada a ver no fim das contas, mas talvez tenha; e isso já vale como uma hipótese a ser posteriormente verificada com base em dados mais concretos.

Não é no Brasil

Com base no sociólogo Mark Granovetter (1978), podemos dizer que o comportamento violento de indivíduos durante algumas manifestações pode ...